Xi Jinping e Luiz Inácio Lula da Silva se cumprimentando na frente das bandeiras nacionais

Terça-feira, 12/08/2025 — Em uma ligação de aproximadamente uma hora, o presidente da China, Xi Jinping, afirmou a Luiz Inácio Lula da Silva que “a China apoia o povo brasileiro na defesa de sua soberania nacional e apoia o Brasil na salvaguarda de seus direitos e interesses legítimos”. A conversa, solicitada por Lula, ocorreu no auge do confronto diplomático e comercial com os Estados Unidos após a imposição de tarifas de 50% por Donald Trump e outras medidas punitivas, e foi lida no Planalto como um sinal inequívoco de respaldo político de Pequim a Brasília — e ao discurso de soberania que o governo brasileiro vem encampando. (Xinhua News, Reuters)

O recado de Xi: soberania, “interesses legítimos” e uma frente contra o unilateralismo

A mensagem do líder chinês foi cristalina e pública. Em comunicados oficiais e na imprensa, Xi reiterou que o Brasil tem o apoio de Pequim para defender sua soberania e seus interesses legítimos, acrescentando que os países devem “unir-se e opor-se resolutamente ao unilateralismo e ao protecionismo” — referência velada às medidas de Washington. A nota chinesa também situou Brasil e China como exemplo de unidade e autossuficiência do Sul Global, com apelo explícito a uma ordem internacional mais equilibrada. (Xinhua News, Al Jazeera)

Do lado brasileiro, veículos registraram a ênfase na defesa conjunta da soberania e no rechaço a “intimidações unilaterais”, reforçando a leitura de que o telefonema não foi apenas protocolo diplomático, mas sinalização política em alto volume. (CNN Brasil, Metrópoles)

O pano de fundo: tarifas, sanções e uma crise sem precedentes com os EUA

A ligação acontece na esteira de uma deterioração acelerada nas relações Brasil–EUA. Trump elevou tarifas de importação a 50% e anunciou uma lista de sanções e restrições de vistos mirando autoridades brasileiras, num gesto que a diplomacia em Brasília classificou como ingerência e retaliação política. Análises internacionais qualificaram o momento como “sem precedentes” nas últimas décadas, com impactos potenciais sobre fluxos comerciais e cooperação institucional. Lula respondeu rejeitando a interferência e intensificando a coordenação com parceiros do BRICS, enquanto evita escaladas que atinjam a economia real. (Financial Times, Reuters)

Nesse tabuleiro, a chamada com Xi funciona como contrapeso estratégico. Além do forte conteúdo simbólico, China é hoje o maior mercado para exportações brasileiras, especialmente de commodities agrícolas e minerais, o que amortece choques vindos de medidas unilaterais de Washington. O próprio diálogo enfatizou BRICS e G20 como canais de multilateralismo para navegar a turbulência atual. (Reuters)

BRICS como arquitetura de contenção: de vitrine a instrumento

A leitura em Brasília e Pequim é que o BRICS deixou de ser apenas uma vitrine de ambições do Sul Global para operar como instrumento prático de coordenação diante de sanções e tarifas. Xi e Lula destacaram o papel do bloco na construção de consensos e na promoção de autonomia estratégica, enquanto ventilam oportunidades comerciais e financeiras para reduzir vulnerabilidades na cadeia de suprimentos. Ao “ancorar” sua reação aos EUA em fóruns multilaterais, o Brasil evita bilateralizar a crise com Washington e ganha poder de barganha. (Reuters, chinadailyasia.com)

Comércio, investimentos e o que muda “no chão da fábrica”

Ao mesmo tempo em que a conversa foi política, houve pragmatismo. As partes revisitaram agricultura e alimentos — com soja e café no topo — e novas janelas de acesso para empresas brasileiras no mercado chinês, em um contexto em que tarifas dos EUA rearranjam fluxos globais. Para Pequim, ampliar compras no Brasil sinaliza resiliência da parceria; para o Brasil, diversificar e agregar valor em exportações é a melhor vacina contra volatilidade geopolítica. Xi descreveu a relação no “pico histórico” e propôs acelerar projetos conjuntos. (Reuters)

Por que a frase sobre “soberania” importa mais do que parece

Expressões como “soberania” e “direitos e interesses legítimos” funcionam, em linguagem diplomática chinesa, como código de alinhamento. Ao empregá-las no contexto brasileiro, Pequim blinda politicamente ações de defesa institucional do Estado brasileiro — inclusive frente a pressões externas. Para Lula, que vem reiterando a independência entre Poderes e defendendo uma resposta multilateral a sanções, o endosso de Xi aumenta o custo de quaisquer novas investidas de Washington e eleva o Brasil na hierarquia de prioridades da China. (Xinhua News, Reuters)

Não é irrelevante, tampouco casual, que a fala de Xi surja após a escalada retórica e tarifária de Trump. Ao conectar “apoio à soberania” com oposição ao unilateralismo, a China transforma o episódio em caso-testemunho do seu discurso global: quem pressionar parceiros por meio de sanções unilaterais enfrentará contrapesos articulados por Pequim com os principais polos do Sul. (Al Jazeera)

O que esperar: três camadas de desfecho

No curtíssimo prazo, a tendência é de mensagens sincronizadas: Brasília seguirá falando em diálogo e multilateralismo, enquanto Pequim repete o mantra do apoio e sinaliza avenidas comerciais que mantenham a economia brasileira girando sem sobressaltos. A foto do dia favorece Lula no plano doméstico — soberania é ativo político — e dá a Xi a chance de performar liderança no Sul Global. (Reuters)

No horizonte tático, a agenda BRICS deve ganhar densidade: combinação de financiamento (ampliando papel do NDB), moedas e pagamentos para reduzir fricções, e cooperação regulatória para amortecer barreiras não-tarifárias. Quanto maior a previsibilidade nas relações Brasil–China, menor o alcance de pressões unilaterais vindas de fora do bloco. (Reuters)

No plano estratégico, a sustentação de “soberania” exige entregas: investimento em infraestrutura exportadora, diversificação industrial e tecnologia que ancorem competitividade além das commodities. A diplomacia ajuda — e muito —, mas a resiliência real nasce de capacidade produtiva combinada a parcerias estáveis. O telefonema não resolve a crise, mas reposiciona o Brasil numa encruzilhada global — e com um parceiro gigante declarando cobertura explícita. (Al Jazeera)

Linha do tempo do dia que reposicionou o eixo Brasília–Pequim

Na manhã desta terça-feira (12/08/2025), Pequim confirmou a ligação a pedido de Lula. Reuters descreveu a conversa como focada em BRICS e oportunidades bilaterais, com menções a tarifas dos EUA e a necessidade de multilateralismo. Logo depois, Xinhua publicou o trecho-chave: “a China apoia o povo brasileiro na defesa de sua soberania”. No Brasil, veículos destacaram a defesa da soberania e a crítica ao protecionismo. A sequência consolidou a narrativa de que o Brasil não está isolado — e que o custo de confrontá-lo aumentou. (Reuters, Xinhua News, Metrópoles)

Conclusão: do telefonema à doutrina

O telefonema entre Xi e Lula não foi um mero gesto de cordialidade entre chefes de Estado. Transformou-se, a partir da escolha de palavras e do timing, em base de uma doutrina prática: soberania como ativo negociável em rede, sustentada por parcerias reais e canais multilaterais. Para além do ruído das tarifas e das bravatas de ocasião, o Brasil ganhou lastro político e opções econômicas. E a China reafirmou, com termos inequívocos, que sua aposta no Brasil não é apenas comercial — é estratégica.

Em tempos de sanções e retaliações midiáticas, ter quem ateste em público a legitimidade dos seus interesses muda o jogo. Hoje, quem fez isso por Brasília foi Pequim.

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